terça-feira, 24 de setembro de 2013

Bem dito.

Bendito e maldito, o poeta.
É nisso que acredito,
e por isso a poesia conquista.
Mas deve o artista sê-lo sem saber
e em sua inocência, tudo conhecer.
Sua verdade é o mundo que há de ver.
Espalhar no espaço o que há de bonito
esse é seu ofício bendito.
Só não deve o poeta
amaldiçoar sua arte.
Fazer dela somente artifício
não deve ser sua parte
mas a sua maldição.
Deveria contar a sorte?
Cantar a morte?
Deveria ou não?
Que faça e que mostre
o lado escuro das coisas
o sul e o norte
a força do fraco
a fraqueza do forte.
Que cometa o delito
e faça valer seu dever maldito.
Pois há muitas verdades na arte,
ou mentiria a arte
artificialmente.
Mente-arte-ficcional.
Artimanha fantástica da vida real.
Correnteza direta para um mundo espiral.

A arte não mente
só dissolve a gente
qual água no sal.

Um comentário:

  1. Me interesso por metaliteraturas. Seu poema vai ficando prosaico e panfletário até o final.
    Mas o que quero destacar é a riqueza dos versos: "Mas deve o artista sê-lo sem saber/ em sua inocência, tudo conhecer". A ambivalência provocada encerra uma "contra-dicção" abundante, a qual suscita os planos possíveis pela poesia. O poeta deve ser poeta, sem saber-se poeta, ou sem saber ser poeta, ou mesmo sem nada saber, só pelo dever. Mas, por outro lado, no plano maior do eu-lírico, quem escreve esses versos também é poeta. Então, quem está dizendo que o poeta deve ser sem saber é um poeta; mas como o poeta não sabe, também não saberia disso que acabou de dizer. Isto é, o efeito de uma força labiríntica, espiral infinito, indicando que a resposta é sempre postergada, perifrásica. Isso garante a sobrevivência da palavra - daí um dever do poeta: explorar, inocentemente, na palavra o conhecimento todo. E assim, claro, nos dissolvemos nessa verdade universal. Grande poema!

    ResponderExcluir